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ENTREVISTA

Joana D'Arc Félix de ministra palestra na Secitec e reforça a importância da educação para transformação social

Publicado: Segunda, 29 de Outubro de 2018, 16h00 | Última atualização em Quinta, 01 de Novembro de 2018, 15h53

A cientista inspirou os estudantes com sua história de vida e reforçou o quanto a iniciação científica pode ser uma ferramenta para tirar jovens da vulnerabilidade

Professora Joana Félix durante palestra no Teatro do IFG
Professora Joana Félix durante palestra no Teatro do IFG

A terceira edição da Semana da Química, realizada durante a Semana de Educação, Ciência, Tecnologia e Cultura do IFG - Câmpus Goiânia, trouxe a professora e cientista Joana D’Arc Félix para uma palestra, que foi realizada no dia 26 de outubro, no Teatro do Instituto. Estudantes e demais participantes do evento lotaram o local para ouvir as palavras de Joana sobre como a educação pode ser a ferramenta mais eficaz para reduzir as desigualdades sociais.

Nascida em Franca, interior de São Paulo, Joana é de origem simples. Sua mãe foi empregada doméstica e seu pai, profissional da área de curtume. Desde pequena, tinha paixão pelo jaleco branco dos químicos, que trabalhavam no curtume com seu pai. Estimulada pelos pais a estudar para superar as diferenças sociais, Joana sempre se destacou pela sua capacidade, mas isso não a impediu de sofrer com o preconceito racial e por conta da sua classe social.

Aos 14 anos, ela foi aprovada nos vestibulares das principais universidades do país e escolheu fazer Química na Universidade Estadual de Campinas. Com 25 anos, foi realizar pós-doutorado em Harvard, nos Estados Unidos. Por conta de contratempos familiares, ela retornou ao Brasil e desde 1999 atua como docente na Escola Técnica Professor Carmelino Corrêa Júnior, em Franca.

Com mais de 80 prêmios recebidos durante sua carreira profissional, Joana também é conhecida pelos seus feitos na área da pesquisa, principalmente, na área de cimento ósseo - que utiliza o colágeno do couro e a hidroxiapatita, extraída de escamas de peixe - soluções para reduzir o impacto no meio ambiente provocado por resíduos do couro, além da adaptação da pele suína para utilização em transplantes em humanos que sofrem com queimaduras.

Defensora da educação pública, ela acredita que a iniciação científica é uma forma de estimular jovens em situação de vulnerabilidade para a área da pesquisa e, assim, contribuir significativamente para o desenvolvimento social.

CCS - Câmpus Goiânia: Professora Joana, a sua vida foi transformada pela Educação. A senhora acredita que essa é a principal ferramenta de transformação social?
Joana - Sofri muito preconceito quando criança e meu pai sempre dizia “estuda para ser alguém na vida e mostrar para essas pessoas que você é capaz. Não brigue jamais com elas. Estude e mostre para elas”. Até um dia, fiquei meio chateada e falei “pai, como vou ser alguém na vida usando um sapato furado e roupa remendada?”. Aí, me lembro até hoje de uma frase que ele disse: “olha, não deixe a condição em que você vive hoje limitar o seu futuro”. Ou seja, você fica pensando nas coisas ruins, se põe no papel de vítima, esconde através disso e não tem motivação para seguir em frente.
Enquanto criança eu acreditei que tinha que estudar para ser alguém na vida e foi. Eu venci por meio da Educação. Por meio dela que as pessoas me conhecem, pelos trabalhos desenvolvidos na Educação. Foi o único caminho que encontrei para vencer na vida. Não tinha outro mais fácil.

CCS - Câmpus Goiânia: Como a senhora utilizou todo aprendizado de vida para ajudar os seus alunos na Escola Técnica Professor Carmelino Corrêa Júnior?
Joana: Pelo fato de ter conhecido as humilhações e as piores formas de preconceito que hoje instruo as pessoas também nessa condições. E fui mais além. Eu seleciono, para os meus projetos de pesquisa, tanto aqueles alunos bem humildes, mas principalmente, seleciono aqueles alunos que estão envolvidos com o tráfico de drogas e a prostituição. Esses não têm nenhuma perspectiva de vida e são jovens, ali na faixa de 14 a 18 anos, ou seja, umas crianças. Então, dando oportunidade, incluindo esses alunos nos projetos de pesquisa, oferecendo bolsa para esses alunos, é bem nítido a transformação.

CCS - Câmpus Goiânia: Como tem sido esse trabalho de incentivar os jovens, ainda no ensino técnico, a se interessar pela pesquisa?
Joana: Trabalho lá na Escola Técnica desde que voltei para o Brasil. Até hoje já orientei 55 alunos. Acho que desses 55, no máximo uns cinco terminaram o técnico e foram para o mercado de trabalho. Os outros foram todos fazer curso superior de Química. Aqueles que tinham pavor de Química passaram a adorar. Isso foi muito interessante (ri). Ou seja para você ver que esses jovens que vivem na vulnerabilidade nenhum voltou para o tráfico de drogas e nem para a prostituição. Ou seja, eles também enxergaram que através da Educação eles também poderiam vencer na vida. E foi o que aconteceu realmente.
Hoje é mais fácil chamar esses meninos que estão na vulnerabilidade para participarem dos projetos de pesquisa. No início foi difícil. A desconfiança era muito grande. Eu tinha que correr atrás deles. Como eles já se sentem excluídos, eles não topavam fazer o projeto porque já sabiam que seriam excluídos. Hoje eu ainda vou atrás, mas é diferente. Eles já se sentem até lisonjeados. Muitos perguntam “ai, será que eu vou mudar de vida?” e falo que depende muito do querer deles.

CCS - Câmpus Goiânia: A senhora defende a Iniciação Científica nos cursos de ensino médio. Deixe uma mensagem aos alunos que podem ter a possibilidade de inserção na pesquisa, ainda no nível médio, mas não a procura por desânimo ou por falta de conhecimento.
Joana: Somente a Educação é a arma mais poderosa para vencermos os obstáculos da vida. Focar na Educação e esquecer os problemas e a condição em que ele vive hoje, porque isso não pode limitar o futuro dela. Usar isso como combustível, como ferramenta para vencer na vida. Essa é a palavra de motivação que eu deixo.

CCS - Câmpus Goiânia: Na sua infância, você tinha alguma noção de Harvard. Já havia se imaginado estudando numa instituição como essa?
Joana: De jeito nenhum. Eu nem sabia que existia o vestibular. Eu falava que queria fazer Química, mas só descobri que existia o tal do vestibular no ensino médio. E mesmo ali, quando chegou no começo do terceiro ano do ensino médio, nunca pensei em EUA, quanto mais Harvard. Nunca pensei nisso não. Foi uma coisa que acabou sendo consequência do estudo, da Educação, uma coisa vai puxando a outra. As portas vão se abrindo e o que não pode é perder oportunidade. A gente não pode ficar pensando no “será”. Enquanto você fica pensando, alguém pega sua vaga.

CCS - Câmpus Goiânia: Joana, qual o papel do professor no estímulo à iniciação científica por parte dos estudantes?
Joana: Como tenho dado muitas palestras, às vezes recebo cartas de estudantes dizendo que tiveram ideias interessantes e que foram conversar com seus professores e eles desmotivam. “Ah isso não funciona, não dá certo, o que eu faço?”. Eu acho que o professor não pode agir dessa forma. Dependendo do que a gente fala, a gente pode destruir a vida de uma pessoa. Então, uma forma que eu uso para trabalhar é a seguinte: todas as ideias que eles têm, a menos que eu veja que é uma coisa que vá explodir, algo perigoso, eu normalmente deixo eles colocarem em prática todas as ideias. Mesmo sabendo que aquilo não vai funcionar, eu deixo porque ele vai descobrir que não funciona sozinho. A partir daí ele vai tendo outras ideias. Que se um aluno chega com uma ideia e você já vai dizendo que isso não funciona, aí ele fica com medo de falar e se diminui. Ele pode ter outra ideia e ficar com vergonha de falar. Fazendo isso a gente acaba bloqueando o aluno. Então eu permito que ele vá para o laboratório, coloque aquelas ideias em prática e descubra sozinho. Daí vão surgindo as ideias e vai aumentando o círculo de leituras. Essa é a melhor forma.

CCS - Câmpus Goiânia: A senhora é uma defensora da escola pública. Na sua visão, o que significa a educação pública para a nossa sociedade?
Joana: A Educação Pública já teve o seu valor no passado. Nossos pais e avós até comentam que, antes, a escola particular era para aquele aluno que não ia bem na escola pública. Ou seja, ela foi valorizada um dia. Então, por que perdeu essa valorização? Nós podemos resgatar isso. Eu acho que, concomitante a isso, tem a iniciação científica no ensino médio e técnico, que é onde eu trabalho. Mas o ideal é essa educação científica já começar no ensino fundamental. Porque aí sim nós teremos jovens mais conscientes, mais instruídos. Você vai desenvolvendo o raciocínio lógico da criança desde novinha. Isso seria o ideal. É a educação pública de qualidade para todos, para que todos possam concorrer no mercado de trabalho ou na educação superior da mesma forma. É isso que eu defendo: educação pública de qualidade sempre.

Plateia atenta à história de sucesso da professora Joana Félix

Plateia atenta à história de sucesso da professora Joana Félix


Coordenação de Comunicação Social do Câmpus Goiânia

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